Antes da tecnologia digital, a prata e a fotografia sempre estiveram intimamente ligadas, podemos até dizer que sem a prata, não existiria a fotografia, certo?
Não necessariamente.
Em 1842, o astrônomo inglês, Sir John Herschel, criou um primeiro processo para a obtenção de cópias baseado em sais de ferro e não nos sais de prata – a cianotipia.
- Quando executada corretamente, a cianotipia, apresenta a mesma riqueza de detalhes de uma fotografia em prata.
Um processo simples e bastante versátil, quase sempre tratado como mera curiosidade e que tem na escala de azul sua principal e distinta característica visual. Para aplicá-lo são somente necessárias duas soluções, uma fonte qualquer de radiação ultra-violeta e água.
A Química.
Primeira solução: diluir 25g de citrato férrico amoniacal (verde) em 60 ml de água, depois completar o volume, com água, até 100 ml.
Segunda solução: diluir 10g de ferricianeto de potássio em 60 ml de água, depois completar o volume, com água, até 100 ml.
Atenção: O citrato férrico amoniacal tem duas formas, a verde e a marrom. A verde apresenta melhores resultados.
O Suporte.
Deve se utilizar um papel que possa suportar uma lavagem prolongada. Os melhores são os papéis usados para técnicas molhadas como guache e aquarela. Pessoalmente prefiro o Canson Montval 300g. Não há necessidade de especial preocupação quanto ao papel ser ácido, aliás a cianotipia, em meio alcalino desbota.
Sensibilização do Papel.
Misturar volumes iguais das duas soluções e, com uma trincha, aplicar diretamente sobre o papel. Alguns autores indicam que essa aplicação não pode ser feita com nenhum tipo de pincel que tenha uma virola de metal porque ocorreria oxidação que influenciaria no resultado final. Essa oxidação de fato ocorre, mas se o pincel for bem lavado após cada sessão isso somente será um problema após várias semanas.
A sensibilização do papel não precisa ser feita no escuro. Uma lâmpada de 40w a uns três metros de distância não causará nenhum dano. Por outro lado nunca use lâmpadas fluorescentes ou tente sensibilizar o papel durante o dia sem estar com as cortinas fechadas (bem fechadas). A mistura das duas soluções é sensível a radiação UV.
Uma vez sensibilizado o papel, deixe-o em um local escuro para secar. Esse papel deve ser utilizado em, no máximo, 48 horas. Após esse tempo a oxidação natural da solução tornará seu uso impraticável.
O Negativo.
Por ser um processo de contato é necessário que o negativo utilizado seja do mesmo tamanho da cópia desejada. Você pode mandar fazer um fotolito ou então, o que é mais fácil e barato, fazer seus próprios negativos a partir de qualquer arquivo digital. O procedimento é simples e pode ser feito com qualquer bom editor de imagens com os seguintes passos:
foto original => escala de cinza => inverter => ajustes de brilho e contraste => imprimir (somente tinta preta)
A impressão pode ser feita com uma boa impressora de jato de tinta usando uma transparência.
Exposição.
Como em todos os processos para cópia usados ao longo do Século XIX, a obtenção da imagem era feita por contato direto do negativo com o papel. Para isso eram usados chassis próprios no entanto, para facilitar nossa vida, podemos fazer a mesma coisa com um sanduiche feito com duas placas de vidro e entre elas, o papel sensibilizado posto sob o negativo que se deseja copiar.
Esse conjunto é exposto ao sol ou outra fonte qualquer de UV o tempo necessário para a formação de imagem.
Aí é que entram a prática e o bom senso. A intensidade de UV varia em função da estação do ano, do local, da hora do dia e das condições metereológicas, ou seja. Você só vai conseguir “acertar a exposição” depois de algumas sessões de ensaio e erro.
“A Revelação”.
Isso é simples. Basta colocar o papel em uma bandeja (essas de plástico branco e borda alta servem), com água corrente até que todo o excesso da solução sensibilizante seja lavado, depois é só deixar secar na sombra e pronto. Em três ou quatro dias, a imagem adquirirá seu tom azul definitivo.
Esse é o processo básico para a cianotipia e existe um sem número de variações tanto de fórmulas quanto de aditivos que podem ser utilizados na “revelação” quanto em viragens ou tingimentos da cópia, mas isso é para outro post.
31 comentários
Comments feed for this article
25/02/2022 às 19:20
Ana Tild
Olá Fabio. Adorei o conteúdo. Obrigada por compartilhar.
Uma dúvida: qual tecido vc recomenda? Obrigada
25/02/2022 às 19:17
Ana Tild
Olá Fabio, adorei o seu conteúdo. Obrigada por compartilhar. Gostaria de saber qual tecido você recomenda. Experimentei em tecido cru e consome muito material. Obrigada
07/11/2018 às 8:51
Workshop | Introdução à Cianotipia
[…] Como Fazer Uma Cianotipia […]
16/09/2016 às 17:01
latinoamericaunidaporlasradios
Boa tarde Fábio, estou afim de experimentar com a cianotipia… queria saber qual é a diferença se utilizo citrato de amônio e ferro (III) de cristais marrom e não verde. É preciso utilizar água destilada ou ionizada? obrigado pela info, o site é mto massa! parabens!
17/09/2016 às 0:27
alternativafotografica
A forma marrom do citrato é aquela originalmente utilizada por Herschel. A diferença para a verde é que é mais lenta, mas o resultado é praticamente o mesmo.
Quanto a água pode ser usada a da torneira mesmo, desde que não seja alcalina. Água destilada ou ionizada podem ser usadas sem qualquer problema.
16/08/2016 às 21:53
Heliana
Olá, já fiz uma oficina de cianotipia e fiquei apaixonada pela técnica. Agora, eu gostaria de oferecer uma oficina para adolescentes, depois, é claro, de ganhar experiência. Gostaria de saber qual é mais o custo para a aquisição de todos os materiais e químicas. Obrigada e parabéns pela descrição.
22/08/2016 às 8:38
alternativafotografica
Olá, Heliana
O custo total fica em torno dos R$ 400,00, sendo a parte química a mais pesada. A vantagem ´que na compra da química nas quantidades oferecidas pelos fornecedores é que vc pode fazer mais de dois litros de cada solução, o que garante muito tempo de atividade.
Uma opção menos custosa: Entre em contato com o pessoal do Lab Clube, no Rio de Janeiro. Eles vendem um kit para cianotipia, além de papeis já sensibilizados.
Pode ser via Facebook ou pelo site http://www.labclube.com. Fale com a Fernanda.
Abraço
29/07/2016 às 12:53
Victória Holzapfel
olá, achei o Ferrocianeto em duas formas: a com 3H2O e a sem. Alguém saberia me dizer qual a diferença entre elas?
Obg
01/08/2016 às 15:52
alternativafotografica
Olá Victória
O 3H2O significa que o sal é tri hidratado. Não faz muita diferença da forna anidra. S[ó que os tempos de exposição serão um pouco mais longos ( pouca coisa, mesmo).
O ideal é que vc procure o reagente que tenha no rótulo a indicação P.A. ( Para Análise).
20/11/2017 às 10:52
Débora Flor
Olá, vi que nas soluções você se refere a Ferricianeto de potássio. Vi que uso o Ferrocianeto de Potássio 3H2O. Isso gera muita diferença no resultado ou nas proporções da hora de fazer a solução?
Outra dúvida: minhas impressões com alguns tipos de papel ficam lavadas, lendo o seu post entendo que isso acontece com papéis alcalinos. Existe uma fórmula para acidificar o papel?
Também tenho dificuldade para imprimir em tecidos, existe um prepera específico pra eles também? Já tentei dar banho de gelatina, é realmente necessário? Obrigada!
20/11/2017 às 14:18
alternativafotografica
Oi, Débora
Não há qualquer problema usar o ferricianeto 3H2O.
Para acidificar o papel basta um banho de uns quatro minutos em uma solução de água com 2 ou 3 colheres de sopa de vinagre por litro. Use esse papel depois de totalmente seco.
Quanto a cianotipia em tecidos não precisa usar gelatina. O segredo é deixar as fibras saturadas com a solução e mais tempo de exposição. (A lavagem também tem que ser por um pouco mais de tempo.) Uma dica: tecidos crus não têm um bom rendimento.
abs
20/11/2017 às 15:50
Débora Flor
Olá querido, muito obrigada pela suas dias e pela atenção, fico muito agradecida! Apenas uma questão: Ferrocianeto e Ferricianeto são a mesma coisa? Eu uso o Ferrocianeto.
Sobre os tecidos, 100% algodão seria o mais indicado?
Ah, hoje tentei comprar seu livro, mas o frete ficou muito caro para a minha cidade. Sabes se tem alguma distribuição por Belém?
Abraço!!
20/11/2017 às 16:28
alternativafotografica
Ferricianeto e ferrocianeto NÃO são a mesma coisa.
Somente com o ferrIcianeto é que a reação acontece. É uma confusão comum. O ferrocianeto não serve para cianotipias.
Quanto ao livro. Lamento, mas só no site da própria editora. Não é um assunto que as livrarias comuns estejam interessadas.
abs
02/02/2016 às 22:30
alessandra
olás! alguém já comprou pela internet? recomenda?
02/02/2016 às 23:36
alternativafotografica
Olá, Alessandra.
O que vc quer dizer com comprar pela internet?
Esse blog não é para vender, mas para mostrar e ensinar a fazer impressões fotográficas, utilizando processos históricos ou alternativos, além de contar um pouco da história da fotografia.
Se vc quiser tentar fazer uma cianotipia, pode encontrar a química necessária na BHerzog, no Rio de Janeiro, ou na SPlabor em São Paulo.
Abs
17/11/2015 às 21:26
Victor
Olá! Gostaria de ajuda para encontrar os químicos no mercado… Onde posso consegui-los? Obrigado
18/11/2015 às 8:51
alternativafotografica
Bom dia, Victor.
Se vc estiver no Rio de Janeiro, pode procurar a BHerzog, na Rua Miguel Couto, Centro.
Caso contrário sugiro que faça uma busca digitando a frase “compra de reagentes para laboratório” e escolher o fornecedor mais próximo.
Um alerta. Vc não vai encontrar os reagentes em pequenas quantidades. Para cianotipias, o mínimo de citrato vendido é de 500g e de ferricianeto, 250g
24/09/2015 às 11:29
Kelly Carolina Corradini
Oláa!
Esta solução pode ser armazenada? Por qto tempo?
Obrigada.
24/09/2015 às 12:25
alternativafotografica
Oi, Kelly
As duas soluções separadas se conservam por bem mais de um ano, desde que guardadas em frascos âmbar e em local sem incidência de muita luz. A solução de citrato, depois de algum tempo, pode desenvolver uma camada de bolor. Para evitar isso é só juntar umas três ou quatro gotas de formol.
Uma vez misturadas para formar a solução sensibilizante não dá para guardar. Tem que usar tudo.
20/02/2016 às 0:26
frederico malaca (@fredericomalaca)
Tenho recorrido a esta técnica durante o último ano. Gostaria de acrescentar um pormenor relativamente à conservação. É possível guardar a solução num frasco, num sítio que não receba luz durante cerca de uma semana. Após esse período vai perdendo a sua capacidade.
20/02/2016 às 19:05
alternativafotografica
Olá, Frederico
Se você desejar uma solução que possa ser armazenada por mais tempo, (aproximadamente 6 meses), veja a postagem sobre a fórmula única de Chambon.
Abs.
12/06/2014 às 10:19
daniel perseguim
onde encontrar esses químicos?
13/06/2014 às 1:31
alternativafotografica
Olá, Daniel.
Se vc estiver no Rio de Janeiro pode ir à B.Herzog na R. Miguel Couto, Centro. Em São Paulo, procure a SPLabor.
28/10/2011 às 16:20
Helen Ikeda
Oi, Fabio,
Os seus artigos são os mais completos , objetivos e práticos que encontrei
pesquisando pela Internet. Estou fazendo um mini-curso na Oficina do
Sesc Pompéia ( SP-SP) sobre processos históricos fotográficos, e suas
dicas dão o maior suporte teórico e técnico.
Obrigada !
Helen Ikeda
Restauradora de Papel e Papeleira Artesanal
18/02/2016 às 12:07
Luiz
Helen Ikeda, também sou papeleiro. Fui aluno do Professor Kamori. Permita apresentar-me assim: https://youtu.be/lb-l1rNkCdw. Quero sensibilizar meus papéis e utilizá-los em Pin Hole. Felicidade!
20/02/2016 às 19:02
alternativafotografica
Olá Luíz
Acabo de ler seu comentário e lamento desapontá-lo ao informar que não é possível utilizar a química da cianotipia para pinhole. Se você reler a postagem verá que é necessária uma fonte UV para que a reação tenha lugar. A câmera pinhole funciona com a luz aparente que é refletida do objeto fotografado e como as ondas uv não são refletidas, você já pode tirar a conclusão.
Abs.
21/08/2011 às 17:11
celiamariapereira
Tenho três cianótipos que foram feitos por meu avô. Tinha muita curiosidade sobre e experimentei o processo mas não com o negativo. Este será meu próximo passo pois a imagem fica muito bonita. A abordagem sobre o assunto está muito boa, mesmo.
11/08/2011 às 15:59
altair
muito bom cara!! pretendo fazer uma oficina da técnica de Cianotipia e o texto me deixo informado do assunto até então desconhecido …
abraço
02/01/2011 às 12:29
Os números de 2010 « Alternativa fotográfica
[…] O dia mais movimentado foi 4 de outubro com 133 views. O post mais popular naquele dia foi Como Fazer Uma Cianotipia. […]
26/04/2010 às 11:05
rodolfo
muito interessante…
muito bem feita a descrição do processo…
criou-me o desejo de execução…
parabéns…
grato
rodolfo
01/03/2010 às 13:50
marianamegre
Olá Fábio. sou portuguesa e como vou fazer um workshop sobre a cianotipia encontrei teu site numa pesquisa pela internet. Boa descrição sobre esta técnica!